Mais um São João, mais uma noite de trapalhices.
Desde sempre assim é. Escondam os vasos, os carros de bois, os bancos, cadeiras e tudo o que estiver solto. Se não o fizerem já sabem que se arriscam a ter de ir procurar os seus bens no adro da igreja mais próxima.
E não vale a pena culpar ninguém. O orvalho de São João põe as pessoas malucas. Isso todos os antigos sabem!
Desde sempre assim é. Escondam os vasos, os carros de bois, os bancos, cadeiras e tudo o que estiver solto. Se não o fizerem já sabem que se arriscam a ter de ir procurar os seus bens no adro da igreja mais próxima.
E não vale a pena culpar ninguém. O orvalho de São João põe as pessoas malucas. Isso todos os antigos sabem!
Noite de festejos pagãos, noites de equinócios. Quem sabe a origem destas tradições. Talvez estas épocas, sendo de rituais de passagem, fossem o momento em que se iniciavam as mulheres e os homens de novas gerações.
Talvez a valentia dos jovens fosse posta á prova em tempos longínquos de modo a provarem o seu valor guerreiro...
Será que hoje estas malandrices sejam réstias destas antigas provas agora direccionados para actos mais inocentes?
Talvez sim, talvez não... Quem sabe...
2 comentários:
"Em muitas terras portuguesas, e principalmente no Minho, existe o costume de, na véspera de S. João – e por vezes outras datas, como sejam a véspera de S. Pedro e, na Lomba de Vinhais, a de Todos os Santos – depois das fogueiras e dos banhos ou abluções na fontes, a rapaziada «roubar» certos objectos – carros de bois, arados, grades, sarilhos de tirar água dos poços, com o balde e a corda, escadas, cancelas e outras alfaias e apeiros, vasos de flores das janelas, cravos ou manjericos, canhotos de lenha, etc., e também animais, burros ou cabras – , que se levam para qualquer lugar especial da povoação, normalmente o adro da igreja, onde no dia seguinte os donos respectivos os deverão procurar e trazer de novo para suas casas; ou que se atravessam nos caminhos e quelhas, designadamente aquelas que conduzem à igreja e por onde devem de manhã passar as raparigas que vão à missa , que são por isso obrigadas a desatravancá-los. Por vezes os vasos de flores «roubados» são trocados de janelas ou colocados junto das fontes: em certos casos minhotos, levam-nos para qualquer capela da igreja, onde as raparigas, no fim da missa, os têm de ir buscar.
Nestas «travessuras», a que dão também os nomes de «maroteiras», «roubalheiras» ou «atracadas» (Guimarães), do S. João, é manifesto o carácter irreverente da costumeira, normalmente dirigido, por parte dos rapazes novos, contra casas onde há raparigas solteiras, acentuando a oposição entre os sexos tão corrente nas diversas celebrações cíclicas festivas, ou então contra pessoas desfrutáveis, por aspecto ou temperamento, e que possivelmente constituem sobrevivências das liberdades licenciosas de fundo mágico-ritual, próprias de certas épocas e cerimónias primitivas, hoje permitidas à juventude nas festividades que lhes correspondem. De facto, abundam os exemplos de casos humorísticos: arados que se levam para o alto da torre sineira, obrigando o dono a ir buscá-los a pontos difíceis, objectos que se penduram nas árvores, cordas de sino que se atam ao rabo de um cão, de um burro ou de uma cabra, que o fazem badalar toda a noite, acordando a vizinhança; em Montedor, um lavrador, que se deitara no seu carro para que o não «roubassem» por «maroteira», adormece profundamente, e a rapaziada rouba-lho com ele em cima, e deixa-o por troça a dormir no adro da igreja; etc. E é este carácter licencioso e satírico que está na base de inúmeros conflitos que a prática suscita por parte das pessoas visadas.
As «travessuras» deste tipo são também conhecidas em Franças, ocorrendo aí em termos semelhantes aos daqui, em diversos lugares e datas, designadamente por exemplo no departamento do Marne, em Terça-Feira Gorda, com o nome, próprio da região alpina, de «Farse du Barri»: é o tambor que no dia seguinte avisa os donos de que chegou a hora de irem buscar o que lhes pertence – carros, bancos, cancelas, alfaias, etc., como entre nós – e que os rapazes amontoaram na praça comunal durante a noite, enquanto ardiam as fogueiras do Carnaval; e este facto, ao mesmo tempo que a antiguidade da costumeira, parece apontar a sua natureza especial."
Veiga de Oliveira, Ernesto, Festividades Cíclicas em Portugal, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1995, p. 156 e 157
Obrigado SR. "Anónimo" por este texto. Duas destas trapalhices são autênticos mitos urbanos pelos quais muitos meteriam a mão a cortar. O caso do Animal atado ao sino e o lavrador a dormir no adro são clássicos da minha infância!
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