Nas eras antigas, os deuses pagãos geriam a vida dos nossos antepassados. O carácter dos antigos, povo de fé e honra, e a introdução da escrita latinizada, permitiu que chegassem até aos nossos dias dezenas de Aras devotas aos antigos Deuses.
Interpretação: A Bormânico, Medamo, (filho) de Cámalo, cumpriu de boa mente este voto.
As aras, eram mandadas talhar por qualquer pessoa. Nativo ou Romano pois estes últimos adoptavam e acreditavam nos Deuses autóctones de cada povo e terra. Em troco de um milagre, de uma boa colheita ou da realização de um desejo pessoal, mandava-se então gravar na rocha o nome da divindade, o nome de quem paga este voto e até o local de onde é originário o mandatário da obra.
Com a chegada do cristianismo cessam as Aras pagãs destinadas ao culto dos falsos Deuses. Imagino quantas devem ter sido destruídas a mando de São Martinho de Dume ou de qualquer outro opressor local.
Interpretação: A Corono, Paterno (filho) de Flávio, de boa vontade, por voto merecido.
No entanto, como em todas as manifestações pagãs, estas não desaparecem mas transformam-se. Uns dirão que ganhou o Cristianismo. Eu prefiro dizer que ganharam os credos antigos pois continuam dissimulados na realidade moderna católica.
Assim, aparecem as Alminhas. As Alminhas ornamentam frequentemente os caminhos, estradas e carreiros Galaicos. Das mais modernas às mais modestas, das mais exuberantes às discretas, elas estão em todo o lado.
Eventualmente passam despercebidas. Estão sempre gastas pelo tempo. Nunca ninguém se interessa em olhar para elas, em ver qual o seu tema, o santo em causa . Na verdade nem sequer sabem o que aquilo é. Porém, por mais longínqua e abandonada que esteja a alminha, quase sempre a vemos arranjada com flores, velas e limpa com cuidado. Isso dá-lhes um certo ar místico.
Assim silenciosas e misteriosas, estas pequenas construções tem no entanto um papel espiritual único na sociedade Galaica. São marcos demonstrativos de uma religiosiade intemporal que vai bem para além da supérflua catolicidade aparente.
Assim, antigamente qualquer pessoa mandava criar uma Ara. Isso ainda hoje acaba por acontecer mas sempre mas de uma forma cristianizada.
Também hoje se escolhe a divindade sob a forma de padroeiro consoante a necessidade em causa, também hoje se coloca a obra à vista de todos e por vezes ainda se escreve quem ofereceu a Alminha e porque razão. Ou seja, mais uma vez, os motivo e a forma não muda. Apenas varia o nome que se dá à religião em causa.
Citando Tomás Maryinez:
"O mundo das almas tem o seu fiel reflexo na arquitectura popular Galega. As representações de almas são comuns em cruzes, nas igrejas e nos esmoleiros. São estruturas que se erguem preferencialmente em encruzilhadas ou cruzamentos do caminho, espaços onde, segundo a tradição, as almas de manifestam aos vivos.
Esta expressão peculiar da arte escultórica Galega converte-se num poderoso mediador entre o mundo dos mortos e dos vivos. Uma nota importante a considerar para interpretar adequadamente estas representações é que nelas aparece sempre a imagem do purgatório, nunca o céu nem o inferno pois na sua percepção evocam fielmente a crença popular que as almas dos fantasmas estão - no contexto do nosso plano existencial - a expurgar as suas penas ou a tentar encontrar o caminho que as leve ao seu verdadeiro destino espiritual no Alén (Além em Galego).
Além disso vimos que estas historias de fantasmas são um dos muitos mecanismos existentes para transmitir os valores da cultura tradicional. As crenças Galegas sobre os defuntos e a morte conservam as mesmas concepções que existiram durante a Idade Media europeia. Assim, a igreja medieval admitia que os mortos se manifestassem aos vivos com o objectivo de purgarem os seus pecados; e é neste contexto histórico que se estabelece o purgatório como o sítio apropriado para o fazer, espaço que um dos criadores deste contexto, Gregório Magno, situa no plano onde os humanos desenvolvem a sua existência."
Esta expressão peculiar da arte escultórica Galega converte-se num poderoso mediador entre o mundo dos mortos e dos vivos. Uma nota importante a considerar para interpretar adequadamente estas representações é que nelas aparece sempre a imagem do purgatório, nunca o céu nem o inferno pois na sua percepção evocam fielmente a crença popular que as almas dos fantasmas estão - no contexto do nosso plano existencial - a expurgar as suas penas ou a tentar encontrar o caminho que as leve ao seu verdadeiro destino espiritual no Alén (Além em Galego).
Além disso vimos que estas historias de fantasmas são um dos muitos mecanismos existentes para transmitir os valores da cultura tradicional. As crenças Galegas sobre os defuntos e a morte conservam as mesmas concepções que existiram durante a Idade Media europeia. Assim, a igreja medieval admitia que os mortos se manifestassem aos vivos com o objectivo de purgarem os seus pecados; e é neste contexto histórico que se estabelece o purgatório como o sítio apropriado para o fazer, espaço que um dos criadores deste contexto, Gregório Magno, situa no plano onde os humanos desenvolvem a sua existência."
Obviamente, quem conhecer a obra do Autor acima citado, perceberá que este está intensamente ligado ao lado místico-pagão dos hábitos humanos. O seu "extremismo" no que toca às motivações dos povos ajuda no entanto a perceber um pouco a fervente religiosidade do nosso povo.
No entanto, à conversa com populares podemos de facto concluir que se na maior parte das vezes, as alminhas são colocadas em encruzilhadas para serem mais visíveis e recolher mais esmolas, muitas vezes também se situam em locais onde algo de grave aconteceu. Verificamos um hábito similar ao observar cruzes e ramos de flores onde houveram acidentes fatais. Mais raro mas não menos interessante é a santificação de um lugar com uma alma por aparecer aí "coisa ruim" e "o demónio". Finalmente, estas peças são também muitas vezes utilizadas como meio de "dar sorte" e proteger a casa, herdade ou determinada zona dos eventuais males que possam advir. E no fundo uma forma de pedir clemencia a Deus.
O que interessa reter é portanto que estas pequenas obras merecem um olhar atento pois são uma parte da nossa herança espiritual. Uma herança que a vasta maioria das pessoas despreza completamente. Hoje, como há 3 mil anos, por qualquer razão se mandam erguer pedras ou obras votivas como marca do nosso agradecimento. É uma manifestação cultural genuína e valiosa.
Não nos preocupemos com acreditar ou não em Deuses ou em Deus. O que realmente importa é reconhecer nestas obras de arte um pedaço da nossa história, ver um reflexo dos nossos antepassados e uma janela sobre quem fomos, somos e seremos. Ao apreciar estas relíquias teremos mais fé e orgulho em nós e, em ultima analise, isso é que nos salva todos os dias.
4 comentários:
um belo texto... com uma critica muito bem conseguida.
é bom que estejamos mais atentos e não elevemos ao esquecimento este legado.... temos que respeitar sejamos crentes ou não... até porque esta manifestação artística como hoje a conhecemos, tendo por influencia as Aras Romanas, têm por base os nossos ancestrais cultos místico-pagãos nas encruzilhadas, caminhos, aos defuntos e um ponto que penso não ter sido referido... as fontes!
estas alminhas são o universo minimalista que está perto de nós... deixe-mo-nos levar pela sua atmosfera espiritual...
Caro Sr, ou Sr.ª anonimo,(ª).
De facto as alminhas tem um fundo simbólico que transcende a religião.
E um acto puro de etnografia e antropologia.
As fontes... As fontes são tão especiais que merecem um Post À parte...
Vá passando!
Excelente informação,
excelente recolha.
Obrigada pela partilha :)
O mais curioso é que esses "altares" à beira das estradas existem muito aqui no interior do Brasil e são parecidos com esses, menos enfeitados, mas com cruzes, velas e flores. Há principalmente onde houve acidentes. Será que os daqui são "filhos" dos daí?
Saudações do Brasil.
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