sábado, 6 de outubro de 2012

Bento da Cruz - 1986 - Historias da Vermelhinha


Bento da Cruz é mais um daqueles autores através dos quais se pode respirar a plenos pulmões os perfumes do passado.

A sua obra é um hino a uma cultura desaparecida. Uns tempos  diferentes em que muitos aspectos da vida eram reflexos perfeitos de antigas e misteriosas civilizações.

Em muitos dos seus contos vê-se referência a Celtas e à vizinhança com os vizinhos Galegos.

A obra de Bento da Cruz, bem que apenas virada para o relato do que era a região Barrosã há mais de 70 anos, acaba por dirigir-se para uma inevitável constatação de pertença cultural ancestral.

Tal como outros da mesma valiosa e raríssima estirpe (como Camilo, Torga etc), por falar do que vê, do que sente e do que sabe, as menções ocasionais a temas que nos dizem respeito aparecem:



Será fácil rir-se às gargalhadas com este grande contador de histórias. Facilmente nos imaginamos numa daquelas aldeias que, há bem pouco tempo "ainda floresciam de vida".

Deliciar-se com o humor ingénuo dos nossos antepassados, através da voz genuína de Bento da Cruz é não só relembrar (ou descobrir) o modo de vida dos nossos avós como, também, uma lição profunda de etnografia contada por uma pessoa que, de facto, recolheu e viveu aspectos de uma era aniquilada pelo "progresso".


domingo, 2 de setembro de 2012

terça-feira, 10 de julho de 2012

Há mais Braga... para além da romana!


Boas notícias para aqueles que, como nós, reclamávamos com a insistência de certos municípios em promover uma história "a preto e branco" (mas sem o preto, ou sem o branco) para fins comerciais e de imagem.

A Braga Romana, sendo um circo que não representa absolutamente nada a realidade da época (ver aqui), não só induz gerações em erro sobre as suas origens como, mais grave ainda, permite a aniquilação da memória de uma cultura ancestral e cujos muitos aspectos, cada vez mais ténues e esbatidos pela vida moderna, fundamentam alguns dos nossos comportamentos.

Porém, de vez em quando, algumas iniciativas de valor aparecem:
  

Entre 19 e 22 de Julho, o centro da cidade vai ser transformado num castro da Idade do Ferro, numa iniciativa que pretende divulgar o povo que habitou Braga há três mil anos: os brácaros. O desafio partiu da Associação dos Artesãos do Minho e foi de imediato acolhido pela organização da Braga 2012: Capital Europeia da Juventude. Associam-se ainda ao evento a JovemCoop —Jovem Cooperante Natureza / Cultura, a Junta de Freguesia de Maximinos e o Museu D. Diogo de Sousa. O evento vai decorrer no Largo de São Francisco, Rua do Castelo, Rua de Janes e Largo de São João do Souto.

Além do povoado castrejo, delimitado por uma muralha com dois pórticos de entrada, o evento ‘Povoado dos Brácaros’ contará ainda com um mercado alusivo à época, uma praça da alimentação, muita música celta a animar as ruas e recriação de alguns rituais daquela época, concretamente um casamento e um funeral. A organização aposta ainda na vertente lúdico-pedagógica, com ateliers alusivos ao tema em que já estão inscritas cerca de 400 crianças que frequentam ATL’s no concelho. Destaque ainda para uma conferência sobre a cultura castreja, pelo arqueólogo Gonçalo Cruz, responsável pela Citânia de Briteiros.


Projectar a cidade mais antiga


Na apresentação do evento ‘Povoado dos Brácaros’ ontem à comunicação social, o vereador Hugo Pires realçou que um dos objectivos da CEJ passa por mostrar as nossas raízes, costumes e história.

“O que aqui se pretende é isso: mostrar aos bracarenses o povo que habitou esta região antes dos romanos”, realçou, enfatizando a aposta em projectar a marca Braga como a cidade mais antiga de Portugal”.

O presidente da JovemCoop, realçou que a associação se associa à iniciativa pela sua componente histórica. Ricardo Silva sublinhou que “Braga tem muito mais para desvendar sobre a sua história”. Neste caso, o evento mostra Braga na Idade do Ferro e Ricardo Silva destaca que nas elevações em volta da cidade de Braga a cultura castreja é muito expressiva.

Deste evento, o líder da JovemCoop espera que saia a ambição de mostrar “outras Braga’s para além da romana”, porque também existe a barroca, a medieval e muitas mais. 

“Braga é poli cronológica. A JovemCoop defende que a sua história deve ser contada como um todo e não apenas dando destaque a um período”, argumentou.

Já Perpétua Ferreira, técnica do serviço educativo do Museu D. Diogo de Sousa, explicou que os ateliês para crianças vão decorrer nos dias 19 e 20, sublinhando a elevada adesão dos ATL ao evento. Realçou ainda que as crianças vão trabalhar sobretudo com materiais reciclados.

Luís Pedroso, em representação da Junta de Freguesia de Maximinos, elogiou a iniciativa da Associação dos Artesãos do Minho e a reafirmou a disponibilidade da autarquia local apoiar o evento naquilo que lhe for possível. O repto está lançado: durante quatro dias os bracarenses são convidados a recuar três mil anos e conhecer como era Braga na Idade do Ferro.


http://www.correiodominho.pt/noticias.php?id=62701

Não espero nada de especial deste evento que, certamente, não terá qualquer semelhança em dimensão com a Braga Romana.

Porém, quando não há pão, até as migalhas vão.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Do outro lado do rio

Interessante projecto em que estudantes Galegos vieram, durante um mês, descobrir o povo do Porto. Mas não foi só o povo do Porto. Foi também a língua Portuguesa, a cultura dos seus vizinhos "Do outro lado do rio".

Pena é que não hajam mais iniciativas do tipo. Ainda mais penha tenho que, nesta relação de irmãos, apenas os Galegos de hoje se interessem pelos Portugueses. Os Portugueses, esses, raramente se interessam pelos Galegos.

A língua, que os Galegos tanto estimam (tanto a variante deles como a nossa), é uma fonte de interesse e de descoberta pessoal. Porém, se eu fosse Galego, perguntar-me-ia porque é que é comum interessar-se pela língua dos Portugueses e, os Portugueses, tão pouco se importarem com a Galega.

É que nesta coisa complicada, e falo do Galaico Lusitanizado e do Galaico Castelhanizado, nenhuma vale mais do que a outra. São ambas duas faces da mesma moeda.

domingo, 11 de março de 2012

A Seca!

O Noroeste ibérico é uma região atípica dentro da península ibérica.

A sua verdura estonteante tem impressionado olhos, corações e inspirado as almas dos poetas (pelo menos até ao início da devastação urbanística moderna) desde sempre. O contraste paisagístico entre o Sul/Interior e o Noroeste é brutal e, como o homem é resultado do ambiente onde vive, também as pessoas são diferentes.

Escusado será dizer que toda essa riqueza paisagística e humana é fruto de um elemento específico. Nele podemos concentrar todas as razões para sermos o que somos e termos vivido de uma determinada forma até ao presente.

Falo da ÁGUA.

Exemplo típico de uma superfície frontal que foram nulas este ano

A chuva, oriunda das superfícies frontais, por norma frequentes no NO, é uma visitante tradicional das nossas terras durante muitos meses do ano. A orografia da região, com as suas montanhas que chegam aos 1500m a curta distância do litoral, transformam nebulosidade em precipitação em dias que, no resto do litoral Ibérico, apenas se vêem nuvens altas. Assim, o Maciço Gereziano e seus adjacentes (Cabreira, Barroso, Xurês etc) tornam-se dos pontos com maior pluviosidade da Europa com cerca de 3000mm anuais. Esta abundância é depois repartida através de milhares de riachos e ribeiros que desaguam nos muitos rios da região fertilizando, ao mesmo tempo que produzem força mecânica, os verdejantes vales.

A quantidade de chuva que habitualmente nos chega permitiu que o nosso modo de vida, e paisagem, fossem considerados "Atlânticos", mais típicos da Europa média, do que propriamente Ibéricos ou "Mediterrânicos", como alguns mais distraídos ainda nos querem adjectivar.

É a abundância de água que tornou possível o modo de vida tradicional da região

A cultura do Milho Grosso, o cultivo do Campo / Prado, a policultura e a imensa variedade de actividades (Litoral, Ribeirinha, de Vale, de Montanha etc.) presentes nesta região apenas é (foi) possível devido às características de uma terra que, em pleno Agosto, conseguia tratar de milhares de hectares de milherais em regime de regadio aberto enquanto grande parte da península sofria dos malefícios de uma estação quente prolongada e intensa. Coisa que, no NO, não era comum.

Registo oficial da maior seca da história moderna

Falamos deste tema da seca porque, efectivamente, estamos a viver o PIOR ANO DESDE QUE HÁ REGISTOS EM PORTUGAL. Ou seja, desde 1931 que não tínhamos um inverno tão seco. De Janeiro a Março a precipitação ocorreu apenas em 4 dias e conseguimos encontrar-nos em seca EXTREMAMENTE SEVERA em pleno Inverno.

Silenciosa, e persistente, estamos a presenciar a seca mais catastrófica de que há memória.

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Ainda a semana passada fui lanchar a uma célebre taberna regional onde encontrei o Sr. Ribeiro. Um homem perto dos seus 80 anos. Nascido lavrador à moda antiga e que, como os da sua geração, fez vida no estrangeiro. Voltou para passar os seus "dias de Ouro" cultivando os campos a seu belo prazer.

Hoje, quase cego, lamenta-se de que nunca vira um ano como esse. Poço quase vazio, erva para o gado que não cresce, fruteiras e videiras a rebentar meses antes da hora.

Conversando um pouco, lá me revelou como, no tempo dele, as pessoas lidavam com as secas que, aparecendo de vez em quando, mas nunca com a frequência e dimensão das que temos verificado nas últimas duas décadas, assolavam as suas terras e punham em causa a sobrevivência alimentar do ano.


"Bem, isso não é do teu tempo! Nem se calhar do do teu pai! Mas olha, lembro-me de um ano, que de Março a Julho nem uma gota caiu. A terra parecia pó e o milho, que tinha de ser regado, estava prestes a secar. E já muito prejuízo havia por aí fora. O rio Ave nem conseguia que os moinhos trabalhassem, mais parecia um ribeiro!

Capela da Santa Marta das Cortiças - Serra da Falperra

Ora, quando isso acontecia, o povo reunia-se e subia à Santa Marta das Cortiças. Fazíamos uma procissão e vinha povo do lado de Braga e do lado de Guimarães. Tirávamos a Santa da ermida, davam-se 3 voltas à mesma e passava-se pelos passos que lá estão. Uma vez disseram-me que até foram até à Sé de Braga com a imagem tal era a aflição. É que naquele tempo se não se colhesse podia-se morrer de fome!"

A subida à Citânia em honra de São Romão, o padroeiro deste monte, ainda se realiza

" Mas olha que não era só essa procissão que se fazia! Também em Briteiros, subíamos ao monte da Citânia, que se chama São Romão, e fazíamos o mesmo. Ia tudo por lá fora a rezar, entrávamos na cidade dos "Mouros" e trazíamos a imagem do Santo que estava lá na ermida. Descíamos até a aldeia e voltávamos a levá-la para cima."

"Se queres que te diga sei lá se dava resultado ou não. Mas sei que quando o fazíamos chovia passado algum tempo. Mas por certo que iria chover mais cedo ou mais tarde. Era a nossa fé, é o que era. Antigamente Deus mandava. Agora ninguém manda em nada."

Curiosamente, choveu efectivamente depois de invocarmos as memórias e crenças de outros tempos!

Após essa pequena conversa, que não foi propriamente reveladora, pois esse tipo de tradições é bastante comum, (apesar de ganhar sempre encanto quando o orador fala de algo que presenciou e que nunca mais será repetido), choveu durante dois dias seguidos. Uns míseros 15 mm que apenas veio limpar o pó do ar.

Ainda acerca destes comportamentos de fé, fica a participação do Fernando Barros:

"... Num noroeste profundamente rural até há poucas décadas, e bastante agrícola ainda nos dias de hoje, anos de seca eram anos de fome, má produção agrícola, desespero. Se hoje em dia as crises e prosperidades se regem por princípios economicistas, especulação bolsista, ratings, FMI's, troikas e outras coisas que tal, antigamente crise e prosperidade era completamente dependente de pragas, pestes, e sobretudo do clima; bons e maus anos agrícolas estavam intimamente dependentes desse factor...

E como muitas das vezes o povo "só se lembra de Santa Bárbara quando troveja", em tempos de seca faziam-se promessas, oferendas e sobretudo romagens pedindo chuva a todos os santos e mais alguns...

Sant'Ana mandai-nos água
Por vosso devino amor

Respondia o bêbado, no meio da procissão:

"p'ra mim BINHO
Senhor'Ana faz favor..."

Na minha terra (S. Pedro do Vale, Arcos de Valdevez), reza a lenda que a Senhora aparecida entre penedos próximo do local onde se situa a Igreja Paroquial setecentista, esteve em tempos em Refóios do Lima, então também pertencente às Terras do Valle do Vez e a devoção das gentes de Refóios à Senhora do Vale perdurou.
Em anos de seca organizavam-se os chamados "clamores", que da Igreja de Refoios romavam dezenas de quilómetros até à de S. Pedro do Vale, pelo caminho outros romeiros, agricultores sedentos de chuva a eles se juntavam. Vinham cantando e pedindo a chuva que lhes regaria os campo, traziam como oferta razas de milho e feijão. Reza a história que na ida já os primeiros chuviscos de faziam sentir... milagrosa a santa...

No entanto, além dos chuviscos (água) que vinham pedir, no caminho de regresso havia também o habitual molho (porrada) que se devia sobretudo às pingas, não de chuva mas de VINHO VERDE que lhes escorregavam pelas goelas no caminho de volta. E reza a lenda que, nesse caminho de regresso, a cruz processional e os paus das bandeiras, eram óptimos auxiliares de contendas, que o nosso povo sempre foi óptimo jogador de pau... e assim, porrada na romaria, vandalização e mau uso das alfaias agrícolas e os padres chateavam-se.
E a tradição acabou...

Acabou não só a tradição das romagens como também a forte dependência das culturas agrárias e, assim sendo, do clima .Há muitos anos que Refoios não vem ao Vale mas fica a tradição e a lenda..."
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Mais do que um mero relato acerca de antigos comportamentos, o que mais nos marca era a forma atenta como as gentes olhavam para a realidade. Porque, efectivamente, realidade é a Natureza. É o céu, a terra, a água, o fogo. São as estações, os frutos e tudo demais que nos permite viver.

Quando, hoje em dia, se ouvem comentários de pessoas que se congratulam por termos um inverno de Sol e sem chuva, não sei se o mundo evoluiu ou regrediu. Para todos os efeitos, em termos Humanos, nunca estivemos num buraco tão fundo.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Profissões Antigas: Carvoeiros

Interessante vídeo que demonstra uma antiga forma de produção de carvão que, obviamente, já não se observa hoje em dia.

Esse é mais um dos muitos ofícios que desapareceram nas últimas décadas. Fica a memória!

sábado, 7 de janeiro de 2012

Citânias de Briteiros e Sanfins à conversa!

Dois Podcasts interessantes acerca de duas das maiores Citânias do do Noroeste Peninsular.

A rádio TSF reuniu dois painéis de académicos que conversaram acerca da Cultura Castreja, os seus problemas, história, mitos e futuro.

Citânia de Sanfins:


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Citânia de Briteiros


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