domingo, 29 de agosto de 2010

Um Pensamento Vs Uma Imagem

Porque ás vezes também penso assim:


"...e constantemente penso nas belas estradas do Minho, nas aldeolas brancas e frias - e frias! - no bom vinho verde que eleva a alma, nos castanheiros cheios de pássaros, que se curvam e roçam por cima do alpendre do ferrador..."

5 comentários:

elaneobrigo disse...

dá que pensar sim...

Anónimo disse...

PAISAGEM MINHOTA

As árvores de pé, na solidão dos montes,
Como estátuas que um povo original ergueu,
Abraçam com saudade os largos horizontes,
Quase escalando o céu.

Ali as aves vem cantar a toda a hora;
E em baixo, pelo vale, escuta-se um ribeiro,
Que entoa em doce paz uma canção sonora
Como um clarim guerreiro.

Mais longe o lavrador, curvo, seguindo a grade,
Amanha alegremente a terra para os filhos,
E o sol entorna a prumo a sua claridade
Nos cálices dos junquilhos.

As montanhas ao ar levantam majestosas
Os seios, onde a alma ás vezes vai achar
As atracções do abismo, as visões pavorosas
E os beijos do luar.

De certo achas formosa, esplêndida a paisagem,
Nada falta á harmonia unanime das cores:
A Natureza fala uma heróica linguagem
Nos ventos e nas flores.

(...)

Guimarães, Setembro de 1879
J. Leite de Vasconcelos, Baladas do Ocidente

Anónimo disse...

(...)

Tenho em meu peito esse espinho
Que se chama «sentimento»;
Amo os harpejos do vento,
O aroma do rosmaninho;

E por muito que eu quisera
Vencer-me, afogar bem fundo
Este desejo profundo
De luz e de primavera;

Sepultar a fantasia
Na noite da realidade,
Como um asceta ou um frade
Na sua cela sombria,

Nunca eu pudera deixar
De amar os astros e as flores,
O horizonte de mil cores
E as doidas ondas do mar!

(...)

Caldas das Taipas, 23 de Junho de 1881.
J. Leite de Vasconcelos, Baladas do Ocidente

O Galaico disse...

Olá caro "Anónimo",

J.L.Vasconcelos tem uma sensibilidade para com as coisas de que gosto que faz com que o coloque muito alto na minha escala dos grandes Portugueses...

Obrigado pela Partilha. Usarei eventualmente um poema destes para um Post caso me sinta nostálgico que chegue.

Anónimo disse...

Olá. :)

Sabes, aproveito esta onda de nostalgia para sugerir, neste teu espaço público, um regresso à tradição de soedade, como fórmula final de despedida nas cartas e nos posts, em vez do banal cumprimentos. ;)

Se me permites, vou fazer uma pequenina citação:

«A forma primitiva so-e-dade perdurou na Galiza até o século XV. Podem verificá-lo nos textos bilingues do Cancioneiro Galego-Castelhano, que abrange as poesias líricas da idade de transição do primeiro ao segundo período (1350 a 1450), incluindo as de Macias, o Namorado. Ha mesmo poetas de hoje que a empregam, p. ex. D. Rosália de Castro e Curros Enriquez nos Aires de minha terra.
(...)
Seja como fôr, certo é que saudade de soidade ou suidade não é evolução fónica.
O ditongo oi, como equivalente de ou, e representante de au originário, é normal. Coisa cousa provêm de causa; oiro ouro de auru; loiro louro de lauru, etc. Anormal é o oposto: au de oi. De mais a mais, num período em que todos pronunciavam ainda so-i-dade.
Temos de recorrer, repito-o, à analogia, à associação de ideias, ou à etimologia popular, isto é a processos psicológicos, para encontrarmos a chave do enigma e explicar a substituição esporádica de o-i por au, que, aumentando a sonoridade melancólica do vocábulo, aumentou ao mesmo tempo sua significação: o conteúdo, o espírito, a alma.
O influxo que houve, pode ou deve provir de palavras que principiavam com saud...
Distingo dois grupos, diversos, comquanto aparentados. Primeiro, o verbo saudar de salutare com o substantivo saude-salute, populares e muito usados. Segundo: o substantivo culto, mas bíblico, e por isso até certo ponto popularizado que acabo de citar: saudade de saludade<salutate o qual significava salvação (Heil), e substituía às vezes (em Espanha) o adj. lat. Salutaris (heilsam.) Na boca do vulgo saludade devia forçosamente passar a saudade.
Já outros autores supuseram influxo de saúde em saudade. Mas não disseram como se realizaria o fenómeno, surpreendente realmente, visto que entre salus salutis e seus derivados, e a doentia soidade, e mais derivados de solus, ha um abismo, que nem mesmo com ajuda de saludat na acepção de salvação se transpõe a contento.
Eis o que penso e como combino suídade com saúde e com saludade, e solus com salutaris.
Ainda nos nossos dias, no século XX, os populares, e não só eles, principiam as suas produções epistolográficas, tão curiosas e instructivas, desejando saúde a quem está longe, em terras estranhas, ou pelo menos afastado deles corporal ou espiritualmente. E fecham-n'as saudando esse ente, ou enviando-lhe saudações mil, assim como aos demais parentes, amigos, conhecidos que por acaso estejam na companhia dele.
(...)
Dessas tais fórmulas convencionaes, e de outras semelhantes, milhares de vezes repetidas, isto é: da saúde, das saudações e das suidades à antiga (e talvez de desejos de saudade, (salutate) enviadas e tornadas) é que a, meu ver, sairam as saudades modernas em que ha parte de tudo isso: da saúde desejada aos ausentes; das saudações com eles trocadas; da sensação de soedade soidade suidade provocada pelo afastamento; e do desejo da única salvação possível.»

A Saudade Portuguesa, Carolina Micaëlis de Vasconcellos, 1914, pag. 49 a 59.

Então, que dizes a recuperarmos a soedade? Qualquer que seja a sua origem, é uma palavra inteiramente nossa! Para além de que dá ao final das cartas e dos posts o seu quê de original... ;)

Soedade!