quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Minifúndios - A nossa definição socio-cultural!


Minifúndios.

Que palavra estranha... Já todos ouvimos falar dela mas qual será exactamente o seu âmbito? O que quer ela dizer ao certo?...

Bem, os Minifúndio são uma marca extremamente distintiva do Norte de Portugal e normalmente associada ao Minho pois é aí que ainda se conseguem observar as repercussões sociais, políticas e culturais deste conceito.

Por definição no dicionário, "Minifúndio" quer dizer: Pequena propriedade rural em oposição ao "Latifúndio".

Pronto. Está definido. Sim mas...

Mas de facto há muito mais conversa a ser feita através desta palavra. Esta palavra é um ícone etnográfico do Norte de Portugal. Através dela podemos perceber melhor toda a nossa cultura e sociedade...

Como??

Bem... Os Minifúndios nasceram com o término do regime feudal. A divisão sucessiva (por herança das grandes propriedades) levaram a que o Norte fosse marcado por esta característica manta de remendos.

Ao contrário das terras do Centro e Sul, a extrema fertilidade da nossa região permitiu que com um pouco de terra se pudesse produzir uma agricultura de subsistência capaz de alimentar famílias tradicionais e ainda de produzir excedentes para vender nas feiras.

Pode parecer simples mas quem tiver consciência do que era a vida rural nos tempos pré-industriais terá de se espantar com a riqueza extrema do território e a aptidão divina do nosso clima para permitir estes "milagres" da multiplicação.


Esta fertilidade e o regime de privacidade tanto como propriedade dos minifúndio traçaram marcas profundas na cultura do nosso povo pois, como disse um porf. Catedrátido da Univ. do Porto (não me recordo do nome) num programa de rádio:

"Na nossa terra nunca ninguém precisou de ninguém. A sociedade defendia a sua propriedade com unhas e dentes pois não dependiam das ajudas externas. Por isso, matava-se com uma sacholada quem comesse um cacho de uvas ou colhesse indevidamente umas castanhas. Isso é um contraponto por exemplo com os países nórdicos que, pelo contrário, tinham de se unir para sobreviver à mãe natureza."

Continuou ainda com:

"Assim, esta cultura de orgulho desmedido e vontade de querer fazer sozinho tornou-se o maior mal político do Norte de Portugal. Os países Nórdicos, aqueles que culturalmente se basearam na união e entreajuda, não são os mais desenvolvidos por acaso..."

De facto... Esta foi uma revelação que faz todo o sentido do mundo. Os casos Braga - Guimarães, Viana do Castelo e o resto do Alto Minho e, no passado, Viana do Castelo - Braga, são o perfeito exemplo desta mentalidade.

Esta cultura entranhada no sangue e nos hábitos de depender de si próprio não é compatível com os dias de hoje. Esta apenas é valiosa na paisagem rural pois fez do Norte o Jardim de Portugal. Para muitos paisagistas o Minho é por exemplo um perfeito exemplo de paisagem "Bocage" ao nível da Toscânia e Bretanha.



Ainda há pouco um jornal desportivo teve um artigo de sensatez rara. Citando parte dele:

V. Guimarães - Sp. Braga (19h30, SportTV2)
Minho em ebulição

Consumidos na medida certa, defeitos como o egoísmo e a inveja só podem dar bons resultados, e o Minho, o tal paraíso dos minifúndios, serve de prova.

Minhoto que se preze raramente gosta de partilhar a mesma parede com o vizinho, daí que a primeira coisa que faz antes de qualquer outro tipo de construção é delimitar bem o seu terreno, por mais pequeno que seja, com muros deixando bem claro que ali é expressamente proibida a entrada de estranhos. Só mais tarde, bem no meio das fortificações, é que nascem casas.

O curioso desta prática ancestral é que ninguém padece de solidão, porque o minhoto até gosta de se cruzar em festas.

Tantos muros sugerem um absoluto alheamento, parece que uns se estão realmente nas tintas para os outros, mas, na verdade, todos sabem da vida uns dos outros numa lógica de imitação que resulta num espírito empreendedor sem igual.

Assim, quando ouvirem falar em minifúndios lembrem-se que esta palavra é talvez a que define da melhor maneira o Norte de Portugal. Tanto a paisagem como, as terras, a mentalidade, cultura e casmurrice política.


Os nossos dirigentes são teimosos e insistem em querer o mesmo tratamento que o seu vizinho mesmo que não faça sentido absolutamente nenhum. Por ex, assisti a um relatório de uma reunião da câmara municipal de Guimarães onde uma vila demandou a construção de piscinas municipais porque a outra tem um rio a passar por lá e eles não...

Ou então o falido IPVC ter recusado fazer parte da UM por orgulho do vereador Vianense que insistiu em ter a sua própria academia sem se preocupar com a mais valia que seria para a região e seus alunos criarem a maior universidade do país...

Também posso recordar o triste exemplo da recusa de Guimarães em fazer parte da região de turismo do Verde Minho por receio da má divisão de verbas por Braga. Assim criou uma ilha ridícula chamada "Zona de Turismo de Guimarães" que nada tem para mostrar para além de um centro histórico e hipotecando o desenvolvimento da indústria turística desta parte do Minho.

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Resumindo o Minifúndio somo todos nós. E o lavrador a competir com o vizinho para ver quem mais produz, são os vizinhos a roubar a água uns aos outros, as mulheres a cuscar a vida uma das outras e a mostrar que são melhores na lide da casa que a competição, os políticos a querer fazer ver que a sua vila ou concelho é mais e melhor que aquele e os caçadores a envenenar os cães do colega para que ele não possa se gabar no café.

No entanto, apesar de isso tudo, o que nos torna especiais é a capacidade de, quando é preciso, erguermos-nos acima destas rivalidades. Por isso é que os trabalhos rurais eram comunitários, as romarias cruzavam todas as terras sem discriminação e, quando falam da terra falam do Norte com0 um só!

Para finalizar, fica uma citação do artigo antológico de Miguel Esteves Cardoso em que consegue demonstrar que apesar da rivalidade e orgulho, o Nortenho ascende acima de isso tudo e demosntra que o seu coração sabe a verdade. Sabe que somos um povo!:

" Este sacrifício colectivo, em que cada um adia a sua pertença particular - o nome da sua terrinha - para poder pertencer a uma terra maior, é comovente. No Porto, dizem que as pessoas de Viana são melhores do que as do Porto. Em Viana, dizem que as festas de Viana não são tão autênticas como as de Ponte de Lima. Em Ponte de Lima dizem que a vila de Amarante ainda é mais bonita..."

3 comentários:

Anónimo disse...

Curiosa "coincidencia". A palavra minifundio na Espanha remite directamente à Galiza. Saudaçons...!

O Galaico disse...

Olá caro Vixia!

Prazer em ler os seus preciosos comentários...

Sim.. de facto mais uma "coincidência" banal...

Aliás, a Galiza e o Norte de Portugal são feitos de uma enorme série de coincidências mútuas ... eheh

Cumprimentos

Elaneobrigo disse...

Uma curiosidade é que praticamente toda a gente na região da gallaecia possui um pedaço de terreno!

Digamos que mais de 90% das gentes do Norte possui terreno enquanto que no alentejo e outras regiões do país 90% dos terrenos pertencem a uma minoria de pessoas!