A mais sensata e verdadeira ideia que, por ser óbvia e real, deixa de ser ideia e revela-se portanto sendo apenas constatação, que ouvi esta semana foi a de uma operadora turística que ficou hospedada uns dias no hotel.
Vivendo há vários anos no Algarve onde trabalha com os campos de golfe da região para atrair os bolsos recheados do turista desejado, a senhora que primava por alguma falta de cultura comum, pronunciou-se da seguinte forma:
-Que linda é esta região! Tão diferente do Algarve e de Lisboa. Estou encantada.
Palavra puxa palavra confessou-me que do Norte nada conhecia para além do Porto.
Aliás, note-se que para metade da população de Portugal, O Norte é uma parte de Portugal que não é mais que lavradores, campos, mil e uma igrejas e um sem fim de provincianos desligados do mundo.
Lamentavelmente,na minha óptica, esta realidade há muito não existe. Porto, Guimarães, Famalicão, Braga, Barcelos, Viana etc. sucedem-se pelos vales sem nunca se distinguirem realmente o fim e o inicio das zonas urbanizadas. Até no parque nacional existem milhares de pessoas a viver. A única região que ficou protegida (mas por isso ainda mais empobrecida) devido a inacessibilidade foi Tras-os-Montes. Hoje, quem quer ver como se vivia antigamente, tem de ir ao Barroso, a Miranda do Douro etc.
Como disse um amigo meu quando observávamos o vale do Ave desde a citânia de Briteiros:
- Estas a ver aquelas casinhas ali no fundo? Aquelas perdidas ali no meio das leiras e da vertente daquele monte?
-Estou porque?
-Ora bem, isso no Alentejo chamam-lhe uma vila...
Não se iludam. O Norte é imenso e a riqueza, ilimitada fertilidade desta terra, chegou para popular Portugal, as colónias e mais recentemente boa parte de cidades e alguns pequenos estados da Europa.
Voltando a operadora turística que, espantada, dava-se conta da surpreendente realidade Minhota, continuava a pronunciar a sua admiração pelos miradouros dos sanctuarios de Braga, o centro histórico Vimaranense e da verdejante costa Marítima cuja paisagem protegida se estende até a nossa irmã Galiza.
Comentou também as sublimes paisagens dos campos de Golfe do Norte e teve a certeza de que era isso de que estava a procura.
Usando não as suas exactas palavras mas a sua ideia geral:
-Os meus clientes estão fartos do Algarve. Não gostam do destino que dizem ter-se perdido na cultura global e economicista das massas. Já não encontram a substancia naquela região que complementava a estadia. Os campos são bons. Não haja dúvida. O clima excelente. Mas as pessoas aborrecem-se. Jogar no Algarve e em Lisboa é quase a mesma coisa que jogar num qualquer outro destino do mundo pois não se sente o povo, a história nem a genuinidade que tanto procuram os novos turistas.
Admito que a inicial "falta de respeito" desta senhora que pensava que Portugal ia até a região de Lisboa e que daí para cima havia apenas uma cidade de pedra a que chamam Porto, foi perdoada com esta conclusão apenas possível a alguém isenta e que olha com olhos de ver.
- Aqui há tanta coisa para ver. Tantas vilas, cidades, aldeias, miradouros, praias, gastronomia. Ontem fui a à festa das cruzes em Barcelos. Que lindo e tradicional! E tanta aderência da população!
Olhe, e para a semana começa a festa das Rosas em Viana do Castelo. Também é muito interessante.
-Ai é? Então aqui em cima as festas populares já começam?
Sim. Mas estas não são nada de "especial". Deveria esperar pelo S.João de Braga e do Porto, pelo São Pedro da Povoa de Varzim, pela Vaca das Cordas e Feiras Novas em Ponte Lima ou a Senhora da Agonia Vianense. E isso só aqui no Minho.
-Bem! Realmente. Muitas festas...
Oh! E isso não é nada. Quando vem o mês de Agosto cada aldeia tem uma festividade em honra dos seus imigrantes. E ainda temos de contar as inúmeras procissões e romarias famosas. Cada aldeia tem a sua mania, a sua maneira de falar. Se eu vou ao São Bento, a freguesia ao lado vai a Santa Maria de Bouro. Temos depois também, as Janeiras e as manifestações espontâneas.
- Pois. E exactamente isso que falta nas outras regiões de Portugal. Esta manifestação cultural! E isso que os meus turistas querem ver! E estranho que aqui no Norte haja uma tão grande alegria misturada com devoção religiosa..
Sabe.. Isso está em vias de acabar.. Esta é a ultima geração que viveu do campo, que daí retirou o seu sustento durante parte da sua infância. 5o anos atrás, este era um mundo quase medieval... Temo por esta paisagem e por este modo de vida. Há contudo um certo "revivalismo" nas gerações mais novas que já não olham para a vida rural e para os nossos antepassados com desdém mas sim com olhos entendedores e orgulhosos.
-Eu percebo. Isso também aconteceu na minha terra natal na Alemanha. E triste mas é difícil parar o progresso. Mas olhe... Pelo menos pode viver tendo tido o privilégio de, nem que ao de leve, ter cheirado uns tempos bem mais simples (também duros pensei eu)e com substancia.
-Fiquei realmente muito impressionada com a minha curta estadia. Tenho absolutamente que marcar uma reunião com o vosso departamento comercial. Aqui existe um Portugal muito diferente do que o que as pessoas geralmente imaginam.
Satisfeito respondi-lhe:
- Minha senhora, não me leve a mal mas, quem não conhece o Norte, não conhece Portugal.
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